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Minimalismo


Minimalismo


PorJ.FernandoB.Britto

Por décadas, a engenharia de salas limpasse norteou em valores ditos "normalizados” para embasar o dimensionamento dos sistemas de tratamento de ar, adotando critérios de aceitação especificados em tabelas que conduziam a elevadas vazões de insuflação, mesmo sendo estes valores descritos pela própria fonte como “exemplos” e/ou “não normativos”, tais como aqueles indicados na “Tabela B.2 – Exemplos de salas limpas para microeletrônica” da norma NBR ISO 14644-4:2004.


Como a tabela“B.1 – Exemplos de sala limpa para processo asséptico de produção de medicamentos ”não determinava o número de “Trocas de ar por hora” para as classes de limpeza 6, 7 e 8, adotaram-se os valores da Tabela B.2como critério de aceitação, por falta de outros valores.


Não se levou em consideração o que se encontra indicado logo abaixo do título “Anexo B”, onde está claramente indicado “informativo” (ou seja, não normativo), muito menos o título da tabela B.2, descrito como “Exemplo”.


E, mesmo havendo sugestão de se utilizarem velocidades “>0,2” m/s em áreas de fluxo unidirecional com classe de limpeza 5, conforme tabela B.1, continuaram adotando a tabela B.2, onde a recomendação é uma velocidade entre 0,2 e 0,5 m/s, assumindo velocidade alvo de 0,45 m/s e variação entre 0,36 e 0,54 m/s como adequadas.


Acrescentamosaissoofatodequeascondiçõesdeprojetonemsempreserãofacilmente obtidas em campo, independentemente da qualidade do projeto, às vezes impondo incrementos adicionais de vazão de insuflação em determinados ambientes, devido a diversos fatores, tais como:

► Excesso de vazamentos através dos elementos de arquitetura, requerendo vazão adicional para atender o gradiente de pressões requerido.


► Excesso de vazão nos sistemas de exaustão, requerendo maior reposição de ar.


► Falta de autoridade dos registros e/ou reguladores de vazão, impondo excessos em partes do sistema, para se obterem as condições mínimas em trechos críticos das redes de dutos.


► Dificuldades de acesso aos pontos de regulagem.


► Inexistência ou insuficiência de pontos de regulagem em determinados trechos.


► Ajustes inadequados ou excedentes de vazão ou pressão, adotados como “a favor

da segurança”.


Conforme abordado em meu artigo ADF-17AT09, a potência requerida pelos ventiladores aumenta ao cubo de seu incremento de vazão [N’/N= (V’/V)³], o que significa que mesmo pequenos aumentos de vazão, produzem significativos aumentos de consumo.

Cabe lembrar também que acréscimos de vazão de insuflação, além de maiores demandas energéticas e reposição de filtros, impõem aumento da carga térmica, principalmente aqueles devidos a aumentos de vazamento das áreas (impostos pelos gradiente de pressões) ou nas redes de dutos, pois requerem maior reposição de ar, coma consequente elevação adicional da condição termoigrométrica da mistura na entrada da

serpentina, que se torna duplamente afetada: tanto pelo incremento de vazão de ar a ser tratado, como pelo aumento da entalpia na entrada da serpentina.


Uma vez que o aumento da temperatura na entrada da serpentina irá elevar o DTML (diferencial de temperatura média logarítmica) da serpentina, esta ainda poderá ser capaz de produzir resfriamento suficiente, caso exista disponibilidade de fluido refrigerante para absorver o excedente de calor.


Contudo, o aumento na velocidade de escoamento do ar pode favorecer o arraste de gotículas, dificultando a capacidade de remoção de carga latente (desumidificação) e a obtenção das condições de umidade relativa requeridas nos ambientes.


Por outro lado, como geralmente os sistemas de tratamento de ar suprem diversas salas simultaneamente, salas com excesso de vazão de insuflação podem ficar mais frias que o esperado, caso não possuam dispositivos dedicados de reaquecimento, apresentando umidade relativa elevada em virtude do desequilíbrio entre sua carga térmica e o escoamento de ar utilizado para combatê-la.


Mesmo quando as salas com excesso de vazão possuem seus próprios reaquecedores de ar, seu dimensionamento foi efetuado considerando a vazão de projeto e podem não ser suficientes para satisfazer o excesso de vazão, além de, obviamente, aumentarem ainda mais a demanda energética do sistema.


Temos também de considerar o efeito da simultaneidade de operação dos ambientes produtivos, nos quais, frequentemente são demandados longos períodos para limpeza e sanitização de área, ajustes de equipamentos (conhecidos como set up), alimentação de produtos e materiais de embalagem, além de pausas por mudanças de turno ou outras razões para inatividade do processo, períodos durante os quais a dissipação interna de calor é insuficiente para elevar a temperatura do ar até o ponto de ajuste.


Em sistemas onde o controle de capacidade é efetuado pela condição do ar no duto de retorno na entrada do air handler, ponto que efetivamente representa a condição média de todos os ambientes atendidos, certamente ocorrerão variações de temperatura entre os ambientes, o que será “amplificado” no caso das áreas inativas, que causarão resfriamento do ar de retorno global.


Aparentemente, isso seria compensado pelo sistema de reaquecimento interno do air handler ou das zonas / ramais de dutos, contudo, essa elevação da temperatura de insuflação também causará elevação da temperatura das demais salas que se encontrarem em operação, causando ainda mais desequilíbrio.


Devemos lembrar também que, quando o sistema requer controle de umidade, geralmente efetuamos leituras apenas de umidade relativa dos ambientes, nos esquecendo do fato desta ser “relativa” à temperatura da leitura, devendo ser tratada única e exclusivamente em conjunto coma temperatura em que foi mensurada.


Cabe recordar que umidade relativa significa o afastamento com relação à condição de saturação de umidade em uma determinada temperatura, como vemos na figura 1:


Figura 1 – Relação entre UR (Umidade Relativa) e TBS (Temperatura de Bulbo Seco)


Em outras palavras, a umidade relativa representa a proporção entre as distâncias lineares entre o ponto mensurado e o início da linha (zero umidade) e o comprimento total da linha até o ponto de saturação.


Como vemos na figura 1, valores idênticos de umidade relativa, associados a diferentes temperaturas de bulbo seco, representam diferentes umidades específicas (quantidade física de vapor d’água contida no ar).


Quando estabelecemos limites de operação para temperatura e umidade, estaremos delimitando uma área de atuação dentro do gráfico da carta psicrométrica, como vemos no exemplo da figura 2, pela área hachurada em amarelo:


Figura 2 – Faixa de operação de TBS e UR


Pelo gráfico, verificamos um ponto de ajuste com 22ºC e 50%UR e uma área de operação delimitada por dois segmentos de retas verticais e dois segmentos de elipse, indicando a operação entre 20 e 24ºC, com 40 a 60 %UR.


Caso determinadas salas do sistema estejam inativas (com baixa dissipação de calor interna), uma vez que seus escoamentos são mantidos constantes, elas apresentarão temperaturas mais baixas, tal como vemos na figura 3:


Figura 3 – Sala inativa e com TBS baixo

Tal como verificado na figura3, por sofrer excesso de resfriamento, sua TBS fica abaixo do ponto de ajuste e, mesmo com w (umidade específica ó quantidade física de vapor d’água contida no ar) sendo mantida constante, sua UR aumentou significativamente.

Se a vazão desse ambiente for representativa com relação à total, isso afetará a TBS do retorno o suficiente para que o reaquecedor do air handler sejaativado ou aumente sua potência, aparentemente oferecendo correção para o problema.

Contudo, outros ambientes alimentados pelo sistema e que, porventura, estejam operando em condições adequadas, passarão a operar com TBS acima da condição de ajuste, podendo ou não se encontrarem dentro da tolerância permitida.

Em sistemas cujo controle se faz apenas pela leitura do valor da UR, em condições como a representada na figura 3, usualmente seria aumentada a potência de refrigeração, com intuito de remover mais umidade específica do sistema (que estava sob controle), agravando ainda mais o problema, pois a sala ficaria ainda mais fria, podendo apresentar aumento adicional em sua UR.

Como a potência frigorígena de projeto da serpentina de resfriamento e desumidificação foi definida sob condições de projeto e o sistema está operando com excesso de vazão e, possivelmente, maior entalpia na entrada do ar, o sistema já estará operando acima de suas especificações e dificilmente conseguirá suportar o incremento de carga térmica imposto pelo reaquecimento, o qual, dependo de sua posição no equipamento e do aumento do arraste de gotículas imposto pelo excesso de vazão, poderá causar reevaporação do condensado, elevando a umidade específica de todo o sistema.

Isso causará um aumento adicional da condição da mistura de retorno e ar externo, elevando ainda mais a entalpia na entrada da serpentina.


Considerando que a disponibilidade de fluido refrigerante é finita, o sistema irá estabelecer um novo ponto de equilíbrio, que satisfaça a remoção de calor imposta pelo escoamento do ar e do refrigerante, passando a operar com umidade específica maior, mesmo com maior disponibilidade de refrigerante, conforme representado na figura4:


Figura 4 – Nova condição de equilíbrio do sistema

Como vemos na figura4, mantida constante a umidade específica, caso TBS se encontre no limite inferior de 20ºC,sua UR será de ~57%.De modo semelhante, caso opere no limite superior, sua UR será de ~44%.

Porém, para a nova condição de equilíbrio imposta ao sistema, o limite de umidade relativa já seria ultrapassado caso a sala atingisse ~21,8ºC.

Portanto, embora pareça razoável e “a favor da segurança” permitirem-se ajustes com excesso de vazão de insuflação, na prática, isso só seria favorável com relação à concentração de partículas, em detrimento do controle das demais variáveis do sistema. Outrossim, verifica-se na prática que a grande maioria dos sistemas opera com concentrações muito abaixo do limite de sua classe, sendo desnecessário e indesejado o aumento de vazão.

Adicionalmente, inúmeras áreas produtivas sequer requerem classificação de limpeza, tais como as áreas de produção de líquidos orais, contudo possuem critérios de aceitação para número mínimo de trocas/h em suas Especificações de Requisitos do Usuário.

E, como as regulamentações atuais determinam o monitoramento dos gradientes de pressão das salas de processo e de mudança de classe de limpeza, muitos usuários estabeleceram níveis de alerta e de alarme para os gradientes, aumentando ainda mais os diferenciais de pressão e, consequentemente, a quantidade de ar externo necessária para obtê-los.

Com os crescentes custos de energia impactando os custos de produção, faz-se necessária uma ampla revisão dos critérios de aceitação dos ambientes, bem como atualizações das documentações de projeto, aplicação de ensaios em campo e reengenharia.


Para tanto, conforme item 4.5.1 da ISO14644-16: 2019, um time composto por pessoal com expertise nas seguintes áreas de atuação: engenharia, manutenção, validação de processos e equipamentos, operação e segurança & saúde ocupacional, deve ser estabelecida, com o objetivo de rever as Especificações dos Requisitos do Usuário relativas às condições ambientais das áreas de produção (classificação de limpeza e incêndio, TBS, UR, pressão, contenção, etc.) e definir as oportunidades de redução de consumo energético, bem como elaborar as necessárias avaliações de risco / impacto / justificativas inerentes à essas modificações, conforme item 4.10 da ISO 14644-16: 2019.


Estabelecidas as oportunidades de ganhos, embora a redução de frequência dos inversores e novos ajustes de vazão nos ambientes possam ser simples, a reengenharia deverá avaliar também os novos pontos de operação dos ventiladores, para se evitarem instabilidades devidas à aceleração requerida em função da “saturação” dos filtros.


Lembrando que a perda de carga em sistemas fluidodinâmicos é função quadrática da vazão, cabe lembrar que com a redução da vazão, os sistemas de filtragem irão apresentar perdas enganadoramente baixas, o que pode levar seus mantenedores a negligenciarem o momento de sua troca.


Por exemplo: um filtro que passa a operar com 70% de sua vazão de projeto, irá apresentar 49% de sua perda de carga, ou seja, nessa condição, um filtro cuja recomendação do fabricante seja sua substituição ao atingir 500 Pa, já se encontrará completamente carregado ao atingir 245 Pa, quando submetido a 70% de sua vazão de projeto. Dependendo de sua construção, ele permitirá carregamento adicional, porém, sob risco de ruptura da mídia, com a consequente contaminação do estágio adjacente ou do próprio ambiente (se for o último estágio).


Então, surge a oportunidade se substituir as mídias por outras adequadas para a nova vazão ou até reduzir o número de filtros da bateria, em ambos os casos, reduzindo ainda mais os custos de operação.


E, embora os motores que acionam os ventiladores possam operar nas novas rotações, o efeito em sua própria ventilação deve ser avaliado, bem como seu rendimento sob a nova carga, podendo sua substituição por modelos de menor potência e conjuntos adequados de polia, gerar economia adicional de energia.


Não menos importante, a redução da carga térmica do sistema também implicará em menor demanda de fluido refrigerante, devendo ser reavaliada a válvula de controle de vazão de água gelada / quente / vapor e, no caso de sistemas de expansão direta, a substituição da unidade condensadora pode ser necessária, sob pena de ocorrer congelamento na serpentina.


A própria serpentina de resfriamento e desumidificação passará a operar com excesso de capacidade, o que poderá retirar autoridade de seu sistema de controle e baixas temperaturas nos ambiente, podendo incorrer no problema inicial, acarretado pelo excesso de vazão, porém, agora representado por oscilações frequente e de grande amplitude das condições termoigrométricas do sistema.


Por fim, a reavaliação das serpentinas de resfriamento que passarão a estar superdimensionadas para a nova carga, pode permitir a elevação da temperatura do suprimento de água gelada, ajustando o DTML das serpentinas e economizando energia adicional nos chillers (e seu respectivo sistema de condensação) e moto bombas.

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